sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Quando eu digo

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.

Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.

Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
nem se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor


Carlos Drummond de Andrade


Meu pai sempre me diz que a minha geração banalizou o ‘eu te amo’. E eu, claro, sempre fico na defensiva. Digo que, na realidade, ele que é saudosista e que a minha geração não fez nada com o ‘eu te amo’.

No entanto, por mais difícil que seja, hoje, eu concordo com ele.

Fato número um, nós ouvimos no ônibus, no metrô, nas ruas, na fila do cinema e, por um momento, eu me perguntei se era a única pessoa não dizendo ‘eu te amo’.

Fato número dois, sempre me incomodou muito ouvir ‘eu te amo’ de estranhos para outros estranhos (ouvir de estranhos para você mesmo também incomoda, fato). São momentos em que eu estou sentada no ônibus olhando pela janela, admirando a Paulista, e senta um infeliz do meu lado falando no celular e, ao fim da conversa, ele solta um ‘eu te amo’ tão insignificante e livre de emoção que me revolta.

É, me revolta. Todas as células do meu corpo fazem questão demonstrar minha insatisfação com esse ser que ajuda o mundo a banalizar ‘eu te amo’. Mas não serei hipócrita, entre amigos, é comum soltar aquele ‘amo vc’ ao final de cada recado via redes sociais. Será que amo mesmo?

Fato número três, quando amamos de verdade (se você é alguém que não acredita no amor, como você chegou até aqui no texto?), seja lá o que isso significa, soa verdadeiro. Porque soa vulnerável. Soa indeciso, não pela dúvida de amar, mas pela de expressar. Soa patético, se você não for uma das pessoas que ama ou que é amado. Soa transcendental, vai além da matéria desse mundo que conhecemos.

Fato número quatro, esse é muito pessoal. Eu só me incomodo com essa frase banalizada, quando eu estou amando. 

Fato número quatro, hoje, não quero ouvir nenhum ‘eu te amo’ banalizado. Quero aquele bom e velho "eu te amo" pausado, de mãos dadas e olhos nos olhos. É bom dizer, assim como ouvir. Eu gosto de sentir meu mundo de ponta cabeça.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Vestir a Camisa

Da arquibancada, vê-se as cabeças jovens e a alegria antiga. Do alto, percebe-se a tensão e o orgulho de estar onde se está. Do meu lugar, sente-se a multidão e o amor pelo momento.

O jogo começa. Qualquer jogo. E a torcida se anima. Tem muito em jogo, mais que um placar de sucesso, a torcida espera o reconhecimento da camisa que veste.

Os mais tímidos começam a se soltar. É inevitável. Os gritos pelo nome da faculdade preenchem a quadra. A bateria rege o ritmo da festa. E vale dançar, pular e sorrir.

Quanto aos momentos de tensão, esses são muito interessantes. A torcida diminui o ritmo. Os olhares se tornam preocupados. O coração bate intensamente. Mas sempre tem uma alma forte que se desvincula da tensão e carrega a multidão para a festa novamente. Então, são mais gritos, ainda que sofridos.

A faculdade marca um ponto. Qualquer faculdade. A torcida venera os jogadores. Os heróis carregam o orgulho e a torcida carrega os jogadores. Nesse momento um se alimenta da emoção do outro e a quadra deixa de ser o palco de uma partida, para ser o palco de um espetáculo de devoção àquele lugar que você pertence.

Na verdade, rivalidades a parte, tanto faz o lugar a que se pertence. A camaradagem é a mesma e o sentimento de união também. É lindo ver o grito de um grupo. E desprezível a hostilidade para com o outro.

Da arquibancada, eu senti que pertencia àquelas pessoas. Do alto, eu senti muito orgulho de vestir a camisa. Do meu lugar, não queria estar em nenhum outro.

Ah, eu visto a camisa vermelha. 

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Haver

Se não fossem as vozes

E o vento soprando

Sobre a música alta

Talvez, nada houvesse



Sob o céu nublado

Acima do chão esburacado

Apertaram-se as mãos

E tudo houve



Sem estranhas vozes

Sob lençóis marcados

Haveria de ser

E foi


Sob palavras sopradas

Soando como música alta

Entre tantas mãos

É o que há


Sob qualquer vento

Acima de todo o céu

Essas mãos

Hão de ser, sempre

domingo, 25 de julho de 2010

As Palavras

Eram as palavras que ela queria ouvir. E quando elas vieram, ela fez sentido de cada uma em sua cabeça, e seu significado aumentou. Saboreou cada uma delas e se prendeu à principal.

Ela queria dizer tanto. Procurou muitas palavras, mas nenhuma parecia transmitir o que queria dizer sem ter que dizer as palavras em si. Engoliu muitas frases e por alguns minutos pensou que não ia conseguir dizer nada. E, no entanto, queria dizer muito.

Talvez o silêncio ou, ainda, o olhar dela fez com que ele perguntasse se havia algo de errado com o que tinha dito. Claro que não. Estava tudo tão certo que ela não encontrava as palavras tão certas quanto o momento. Logo ela, que tinha tanta intimidade com palavras.

Então, ela afirmou aquilo que se passava em sua cabeça. Disse que era ótimo. Que assim, ela não seria a única. E sorriu. Sorriu por conseguir dizer alguma coisa. Mas algo ainda faltava. Contornou o rosto dele com os olhos. Foi quando tomou plena consciência do que sentia.
Mesmo sabendo que as palavras não seriam suficientes, ela as retribuiu, e, quem sabe, elas transmitiriam o que sentia.

Quase sussurrando, ela sorriu e disse.

‘Eu também estou apaixonada por você’

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Malas prontas

O medo, então, passou.

Ela deixou parou de andar para trás.

Passou a correr para frente.

Esqueceu de prender os cabelos.

E se divertiu no caminho.

Deixou o mundo de lado.

Nem parou para olhar para trás.

Cicatrizou antigas feridas.

Deixou um bilhete para os pais.

Viveria sua vida.

Ela mordeu os lábios.

Sabia que estava perto.

Muito perto.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Sobre meninas e mulheres

Ela abriu a gaveta da penteadeira da mãe. Vasculhou os objetos, não sabia exatamente o que procurava. Encontrou uma fita de cetim cor-de-rosa e pegou. Na frente do espelho, examinou seu rosto, prendeu os cabelos com as mãos e imaginou como poderia prender a fita. Decidiu por prender os longos e ondulados cabelos castanhos num rabo de cavalo com uma chuquinha que estava presa em seu pulso. Com os fios no ar, passou a fita pelas mãos, sentindo a textura do cetim. Sorriu. Se olhou no espelho e delicadamente amarrou a fita cor de rosa em volta do rabo, para finalizar, fez um grande laço. Satisfeita, observou o laço se movimentar em harmonia com sua cabeça.



Voltou-se, novamente, para a gaveta. Nada mais a interessava. Fechou e partiu para a gaveta superior. Extasiou-se. A maquiagem da mãe deslumbrou a menina. Passou a mão por entre os cosméticos, sem pressa de decidir. Finalmente, escolheu um bastão preto e comprido. Pegou-o como se pudesse quebrar a qualquer momento. Fitou o objeto, tentando descobrir para que servia. Na primeira tentativa, destacou a tampa do resto do bastão para encontrar um pincel diferente dos que conhecia, mas, logo, o identificou e se lembrou dos movimentos da mãe em seus cílios. Imitando-a, a garota passou o pincel pelos cílios, de baixo para cima. Olhou-se no espelho. Algo ainda faltava.


De volta à gaveta, procurou aquele pó rosado que a mãe sempre passava nas bochechas. Encontrou-o e, sem delicadeza, espalhou-o pelas bochechas. Riu. O resultado foi diferente do esperado. A cor rosa destacada fortemente em seu rosto a deixaram com um ar de boneca. A jovem não se importou. Pelo contrário, gastou alguns minutos se admirando frente ao espelho. A luz do sol do fim da tarde perpassou pela janela, pelas brancas cortinas e iluminou o laço de cetim daquela menina pintada.


Sabendo o que queria, pegou da gaveta o batom vermelho preferido de sua mãe. Retirou a tampa e girou a parte de baixo do bastão, fazendo com que o batom surgisse da embalagem, como nos filmes. Ela secou os lábios com as mãos, fez um biquinho e começou a pintar sua boca de vermelho. Após a primeira passada, relaxou os lábios. Descontente, pressionou o lábio superior contra o lábio inferior. Houve uma melhora, mas a garota só se satisfez após a segunda camada de vermelho.


Contemplou sua imagem. O reflexo mostrou uma garotinha. Mas ela se sentiu uma mulher.


Até hoje, quando se sente incapaz de enfrentar a vida de frente, ela entra no quarto de sua mãe, senta-se à penteadeira e abre uma gaveta. E vasculha suas memórias, até encontrar aquela que a transforma. Abre mais que embalagens, abre seu coração, na esperança de que a mulher do reflexo seja a mesma sentada à penteadeira.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Príncipes e Princesas

Quando eu era pequena, ganhei uma Barbie. Logo depois, ganhei um Ken. Pela minha lógica e pelo o que eu conhecia do mundo, através de filmes da Disney e de músicas do Vinícius que tocavam na minha casa, a Barbie tinha que ficar com o Ken. Ótimo. Eles casaram, montaram uma casa de madeira, que eu pintei de canetinha de várias cores, mobiliaram a casa com móveis em miniatura e tiveram muitos filhos, que eram, bizarramente, do tamanho deles, porque eu não tinha uma barbie criança.


O Ken cortejou a Barbie, daquele jeito que as princesas eram cortejadas nos livros, e ela se apaixonou por ele, como nos filmes que assistia.

Eu ainda era pequena, mas não tão pequena, e as Barbies faziam parte da minha vida de outra forma: elas ficavam sentadas na estante e eu já não brincava com elas. No entanto, tudo o que elas haviam feito ficou em mim. Então, eu tinha uma cadeira rosa, que era o meu trono, e brincava de princesa. E, sempre, havia um príncipe.

Eu cresci mais um pouco. Foi quando as coisas ficaram confusas. Comecei a ouvir que as mulheres deveriam ser independentes e massacrar os homens. Eu não entendi o porquê, mas anotei o recado. Tomava críticas de quem dizia que eu vivia no mundo da lua, sempre fantasiando sobre príncipes e princesas.

Aconteceu que eu virei uma adolescente e meninos deixaram de viver no meu mundo da lua, para viver, simplesmente, no meu mundo. A verdade? Bom, eu não pensei em nada disso por um bom tempo. O legal era estar com eles.

E um dia, eu cresci. E passei a questionar o porquê que eu deveria massacrar os homens, se eu gostava deles. Porque a minha mãe começou a me dizer que não existiam príncipes, apenas sapos? Porque começaram a relatar estatísticas do índice de divórcios? Porque passaram a contar vantagem das mulheres bem sucedidas e solteiras?

A verdade não parecia surgir para mim. Apenas me confundiam todas essas informações. Mas acreditei piamente que não existiam príncipes e princesas.

Mas por muitos dias seguintes, contemplei o olhar que a minha mãe repousou no meu pai, reparei nos namorados de mãos dadas do metrô, ouvi minha amiga falando sobre o aperto no coração que a música Lugares Proibidos causava nela. E, então, eu mesma me peguei sorrindo, aquele sorriso bobo, que só aparecia quando pensava em certas tardes.

Pois é, eu acredito, sim, em príncipes e princesas.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Sobre começos

Eu gosto de começos. Gosto de não saber o que vai acontecer. Gosto daquela esperança de que tudo, desta vez, vai dar certo.

Os começos são sempre poéticos, mesmo que anti-poéticos. É uma regra. Se miraboloso, é poético por ser inusitado. Se comum, é poético por ser mundano.

Começos exercem uma certa magia sobre nós, seres humanos, que acreditam, mais um vez, em recomeçar. E são poucas as coisas mais lindas que começar.

Adoro começar um texto. Uma amizade. Um prato de macarronada. Um livro. Um passeio. Um curso. Uma boa noite de sono. Um beijo.

Se começos fossem personificados, seriam aquela pessoa que você não tira da sua vida por nada, que te incentivam sempre e que, podem sumir por um instante, mas voltam com certeza.

Só quero sempre ter ânimo para começar. E começar de novo.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Resoluções

Eu sei, resoluções são típicas de ano novo.

Eu também sei que as tradições têm um efeito muito grande sobre todos nós.

Longe de querer introduzir uma nova tradição, venho quebrar uma de maneira pouco ortodoxa.

Farei minha resolução de meio de ano.

Eu prometo não ter medo de me aproximar das outras pessoas.

Eu prometo não pensar que não há solução.

Eu prometo não ter receio de tentar coisas novas.

Eu prometo acordar todos os dias para tentar meu melhor.

Eu prometo não brigar comigo mesma quando não atingir meu melhor.

Eu prometo perdoar aos outros, e à mim mesma.

Eu prometo cantar no chuveiro.

Eu prometo dançar sempre.

Eu prometo, nunca mais, deixar de ir atrás de tudo aquilo que me faz feliz.

domingo, 30 de maio de 2010

Cena 3 - A casa

Em dez minutos estava na casa de sua avó. Reconhecera a fachada pelas fotos. Fernando estacionou o carro em frente à cerca branca. Cecília se lembrou da foto que guardava em sua gaveta de seu pai, ainda criança, sentado sobre cerca com uma bola na mão. Sorriu. E quando percebeu Fernando estava abrindo sua porta. Cecília desceu ignorando a mão estendida do menino.

Ele suspirou. Ela suspirou.

Fernando ficou encostado no carro enquanto ela abria o portão e caminhava na direção da porta. Antes de tocar a campainha, ela olhou para trás. Ele ficou ereto e deu um passo. Ela deu meio sorriso e se virou. Tocou a campainha e enquanto esperava a porta se abrir não percebeu o menino entrar no carro e ir embora.

Uma senhora enrugada, de cabelos grisalhos e presos desleixadamente com grampos no topo da cabeça atendeu a porta.

Cecília reconheceu o rosto da avó, que sorriu por um instante. Sua fisionomia mudou e a velha pareceu envelhecer mais alguns anos. Logo se virou e com dificuldade entrou na casa escura e entulhada e se sentou numa poltrona decadente. Cecília a seguiu.

Parou na entrada da casa. A sua esquerda havia uma cozinha, a sua frente uma escada e a sua direita a sala onde sua avó estava sentada. Perguntou, hesitante, onde deveria deixar suas coisas. Mas a velha pareceu não ouvir. Perguntou novamente e mais alto.

“No quarto a sua direita, no topo da escada”

“Certo” – Cecília disse para si mesma.

A escada de madeira e coberta por carpete denunciava os passos de Cecília a cada degrau. Entrou no quarto a sua direita. Escuro como o resto da casa, mas sem entulhos. Havia uma cama pequena, um armário embutido na parede, uma cadeira e uma pequena mesa.

As paredes eram amareladas, talvez um dia tenham sido brancas. Talvez um dia seu pai tivesse dormido naquele quarto. Cecília sentiu-se nostálgica. Uma nostalgia que nem era dela, mas de seu pai. Ou assim a menina esperava que fosse. Sentou-se na beirada da cama e olhou pela janela, enxergou sua avó mais jovem e ágil, seu pai menino e despreocupado. A moça era bonita, com traços fortes e inesquecíveis. O menino era magricelo e obediente. A fantasia logo se desfez com um enorme barulho. Parecia que uma estante havia cedido ao peso das tranqueiras e tudo estaria espalhado pelo chão.

Cecília correu escadas abaixo. Encontrou a avó sentada na mesma poltrona segurando uma caixa de chocolates que não estava lá antes. Na cozinha, como esperado, panelas forravam o chão.

“Vó?” – a menina tentou – “está tudo bem com você?”

“Chocolates?” – ela ofereceu estendendo a caixa à sua neta. Cecília riu, olhou para a cozinha e disse que era melhor que ela arrumasse a cozinha antes. A avó franziu a testa.

“Chocolates antes de tudo”

Cecília se sentou no sofá à frente da velha poltrona e pegou um chocolate da caixa.

As duas ficaram sentadas saboreando chocolates até que escurecesse. A mais nova sentiu-se grata por estar na presença de um adulto que não indagasse suas decisões. Alguém que não forçaria suas opiniões em sua vida. A velha ficou grata pela companhia.

O cheiro do chocolate a lembrava de algo. Uma memória. Melinda ressurgiu. Lembrou da amiga e de suas conversas. Da desenvoltura daquela morena que não filtrava suas idéias de suas palavras.

“Cecília, você é muito cabeça-dura” – riu Melinda – “Eu não estou julgando, só estou esclarecendo que não nasci para a poligamia” – riu de novo e abraçou a amiga – “e fico surpresa de vê-la defendendo esse tópico tão veementemente”

“Eu simplesmente não acho que devemos etiquetar como certo ou errado o que não conhecemos” – explicou Cecília num tom de voz baixo e contraído. Era como a menina se sentia perto da colega. Apagada.

“Você diz isso sobre tudo”

Melinda gargalhou enquanto passava os dedos entre os cabelos e logo mudou de assunto.

Cecília deu meio sorriso e se voltou para a sala de estar da avó. Olhou para baixo, para si mesma, esperando se reencontrar. Nada. Era a mesma de sempre.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Cena 2 - A ida

Cecília beijou seus pais e subiu para o ônibus. Carregando sua mochila nas costas, apoiada em apenas um ombro, procurou os números correspondentes aos de sua passagem. Ao encontrá-los guardou sua mochila em baixo do banco e escaneou o ônibus, analisando os passageiros. A maioria parecia estar voltando para casa. Percebeu as diferenças no vestuário, no comportamento. Ou era apenas a imaginação da menina.
Esparramou-se no banco, grata por ter o banco ao lado desocupado.
Lembrou-se de sua mãe e suas palavras na noite anterior.

“Cecília, você não precisa ir à sua avó. Não precisa provar nada.”

“Provar o quê?!”

Provar que não precisava de ajuda. Não. Descobrir. Descobrir sua composição. Descobrir com que cores seria pintada, com que palavras seria descrita.

Uma cidade no interior era uma opção. Escolheu a reclusão.

Sua mãe não a entendeu. Seu pai, não se sabe. Foram poucas as palavras, sempre poucas.

Do lado de fora, a paisagem não era espetacular. Cada vez mais seca e dura.

A viagem seria curta. Fechou os olhos e permaneceu inerte. Quando os abriu, casas simples e coloridas montavam o cenário. Não saberia dizer nada sobre a proximidade da casa de sua avó. Percebeu o ônibus diminuir a velocidade. Antes mesmo de o veículo parar completamente, os passageiros começaram a se arrumar para descer. Exceto Cecília. Ela esperou o esvaziamento do corredor para, então, levantar-se e caminhar, segurando sua mochila pela alça, pelo corredor em direção à saída.

Ao passar pela porta do ônibus e pisar o chão de concreto, sentiu uma onda de calor que envolveu seu corpo e o amoleceu.


Ainda abatida pelo calor imperdoável, levantou o rosto e procurou. Um rapaz aproximou-se. Seus olhos eram pretos e redondos, ofuscando os lábios murchos, nariz torto e as cicatrizes do queixo. O rapaz parecia desconfortável em sua própria pele.


“Cecília?” – ele tentou.

“Thiago?” – perguntou a menina, incrédula.

“Não,” - ele arregalou os olhos e continuou – “o Thiago não pode vir, ele viajou, eu acho... Bom, eu sou o Fernando, eu ajudo a sua avó, sabe? Então, fui designado a buscá-la e” – respirou para prosseguir. Mas Cecília não permitiu.

“Tudo bem, então”.

Fernando fez que sim com a cabeça e curvou-se na direção de Cecília, que imediatamente afastou-se, lançando-lhe um olhar assustado e indignado.

“Sua mochila” – ele disse cauteloso – “posso ajudá-la a carregar?”

Cecília inspirou para responder, mas desistindo, expirou todo o ar em seus pulmões e estendeu-lhe sua mochila.

Fernando a segurou e perguntou olhando para os lados da menina – “Cadê sua mala?”

“Que mala?”

“Você só trouxe uma mochila?”

Ela fez que sim com a cabeça.

“Quanto tempo ficará na cidade?” – ele perguntou enquanto caminhava em direção ao carro.

“Não sei’ – Mentiu. Afinal, sabia quanto tempo ficaria.

“Sua avó disse dois meses”

Cecília suspirou e nada disse. A presença de Fernando a perturbava.

Entrou no carro e sentou-se encolhida para a direita do banco do passageiro do carro que ele guiava.

domingo, 23 de maio de 2010

Cena 1 - Sonhos

“Sol, muito sol. Não, apenas sol. Poucas nuvens”. O ar tão quente que amarelo parecia. Também o percebia parado, contribuindo para a sensação de que o tempo não passava. Pensou em se levantar e procurar refúgio na sombra, mas o chão morno amolecia seu corpo, anestesiando-o.
A posição do sol mudou e passou a lhe incomodar os olhos. Decidiu virar-se. Lentamente, rolou para a lateral, até encostar a barriga e, então, metade do rosto no chão de pedra. Uma leve tontura veio, ocupou sua atenção por um instante, e deixou-a. Insolação. Riu da consciência do exagero de seu pensamento. A movimentação dos músculos do rosto, dos lábios e da língua ocasionou certo prazer, um alívio. Mais uma vez, considerou levantar-se. Mas não quis deixar as cores, nem os cheiros das flores que não existiam e as circunstâncias que inventara. Havia alguém brincando com seus pés, admirando-os. Enquanto lembrava-se de sentir cócegas, tentava discernir as flores ao redor. Uma pintura impressionista. Não sabia onde começava ou terminava cada detalhe. Não havia contorno. Sorriu, feliz com a conclusão.

A pessoa que tocava seus pés manifestou-se.

“Você tem pés estranhos.”

“Estranhos?” – replicou – “ainda que esse adjetivo seja comum a pés?” – ponderou. Todos os pés são igualmente estranhos.

“Mas lindos” – disse o menino aos seus pés.
Cecília sorriu e repetiu, em sua cabeça, o adjetivo até que perdesse seu sentido. Lindos. Lindos sonhos. Lindos cheiros. Lindos pés. Não se conteve, abriu os olhos.

Abriu-os para o mundo. Real e concreto. A claridade feriu seus olhos, obrigando-a a fechá-los novamente. Abriu, fechou, abriu. As cores da verdade eram mais fortes e exprimiam um concretismo o qual Cecília não queria encarar. Quis voltar para seu príncipe, anjo, cavaleiro. Quis voltar a ser fada, boneca. Quis.

O primeiro som que lhe chamou a atenção após o devaneio foi o de passos. Pesados e apressados. Tentou repudiá-los, sem sucesso. Sua mãe aproximava-se pelas escadas. Quando os passos cessaram segurou o ar em seus pulmões e esperou o que sabia que viria.

“Cecília, pare de sonhar” – explodiu. Arrependida do exagero, a mãe atenuou a voz – “Volte”.

A menina fez que sim com a cabeça e sem ecoar uma só palavra levantou-se e desceu as escadas, com sua mãe logo atrás falando baixo consigo mesma. Cecília bloqueou os ruídos, fazendo questão de torná-los inaudíveis ou incompreensíveis. Era melhor não saber tudo.

A caminho de seu quarto passou pela cozinha e apanhou uma maçã. Fechou a porta de seus quarto e deu uma mordida. Olhou para sua cama e a mala por fazer e as roupas espalhadas pelos cantos. Sentiu uma injeção de excitação. Só mais três dias e estaria longe de casa. Riu de si mesma e de quão dramática estava nesse dia. Devem ser os hormônios restantes da adolescência. Sim, restantes. Faculdade não era para adolescentes. Dessa vez, soltou uma gargalhada.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Silêncio

Silêncio!

As paredes escutam
Paredes de uniformes
Vestidas de verde-amarelo

Silêncio!

Bateram na mesa
Cabeças nas mãos
Sangue nas paredes

Silêncio!

Um cap caiu
O uniforme rasgou
A corda enforcou

Silêncio!

As paredes escutam
Trocaram de roupa
Estão de arquivos agora

terça-feira, 11 de maio de 2010

Amanhã

Nosso carro

Aquele mesmo

Que não anda sob rodas

Mas que desliza sobre os trilhos

Sabe, eu gosto da sua cor

Cor que eu não lembro agora

Também gosto quando nosso carro fica ao léu

Mesmo que eu não perceba o céu

O que me lembro é da sua mão

Segurando a minha, lembra?

Esqueci o que me disse sobre os pássaros

Foi logo depois que recitou meu poema

É, nosso carro

Tantos encontros

Em tantos mais meses

Muitos corações remendados

E mais sorrisos ainda

O carro é nosso

Engraçado,

Eu sempre volto com um banco vago

Segurando a bolsa e as memórias

Não podem cair

Podem se perder

Então, amanhã, segura para mim?

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Liberdade

Tá, a mídia nos pressiona. Tá, as revistas só colocam meninas magérrimas nas suas capas. Tá, a TV parece só perceber essas, chamadas, beldades de nada de carne e, algum, osso. Tá, eu já sei disso, eu vivo isso. Mas onde está a nossa liberdade? A liberdade de pensamento, a liberdade de ação, a liberdade de sentir o que quisermos sentir?


Então, ficou decidido: o mundo tenta colocar na sua cabeça que você seria muito mais feliz uns 10 kg mais magra. Mas, e você? O que pensa?

Já parou para pensar que isso só é verdade se você acreditar? Já parou para pensar que já te disseram que vermelho é uma cor muito melhor que rosa, no entanto, você, que gosta é de rosa, não se deixou levar? E porque que quando dizem que ser magérrima é melhor, você acredita?

É muito catártico falar mal da mídia e das passarelas que só aceitam aquele determinado tipo de corpo. Mas o que isso muda para você?

Somos livres. Livres para pensar. Para agir. Para mudar. E, claro, para escolher. Se você pensou, agiu, escolheu.

Pode ter escolhido pensar que a pressão foi demais e, agora, você só come abacaxi, porque assim será como determinaram que fosse melhor para você. E, talvez, você seja muito feliz com toda essa magreza, mas, talvez, não.

Ou pode ter escolhido usufruir da sua liberdade de pensamento e decidido que a vida não se resume a massa corpórea.

À você que quer ser feliz, não importa seu peso, ria das revistas que dizem o contrário. Desligue a TV e faça sua própria história. Use a sua liberdade conscientemente.

É mentira que é mais feliz aquele que ignora.

É mais feliz aquele sabe escolher.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Invisível

Ela sempre sorria
Dizia Bom-Dia
Certa vez ela parou
E ninguém nem notou
Ela simplesmente
Nunca mais voltou

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Maria

O nome dela é Maria. Ela queria conhecer o mundo. Ela conheceu Vincent.
Vincent conhecia o mundo. Ele não sabia o que queria. Ele conheceu Maria.

Eles se conheceram num ônibus, de maneira inusitada: ela tropeçou no pé dele. E foi suficiente encorajamento para ele falar com ela. Ou tentar, porque seu português era terrível. Então, falaram espanhol, porque ele falava alemão, ela não, ele falava sérvio, ela não, ele falava francês, ela não. Ambos falavam inglês, mas de inglês ele não gostava. Então, falaram espanhol (apesar dele pensar falar português).
Eles conversaram sobre muitas coisas. Sobre a vida, sobre São Paulo, sobre Berlim. Ela se encantou com seu jeito de rir de tudo, de ficar vermelho a todo momento e com sua curiosidade sobre, simplesmente, tudo, mas, especialmente, ela. Ele também se encantou, mas ela não sabe o porquê. O importante é que Vincent pediu o telefone de Maria e ela, sem muito pensar, concedeu.
Vincent ligou, de um telefone público, o que Maria achou muito engraçado. E eles combinaram de se encontrar. Quando se encontraram, não souberam o que dizer, não souberam o que fazer. Foi preciso tempo. Tempo, este que resolveu o problema. As inibições diminuíram e Maria até chegou a pensar que o português de Vincent havia melhorado.

O que aconteceu estava previsto para acontecer, no entanto, foi delicioso, como se inesperado. Maria beijou Vincent. A partir desse momento, não fez mais diferença o país onde ele nasceu, ou a falta de conhecimento do mundo dela.

Ela mostrou uma São Paulo sobre a qual ele nunca havia lido. E ele ensinou uma porção de coisas a ela, como, por exemplo, que a palavra chá vem do sérvio. Talvez isso pouco importasse para inúmeras pessoas, porém, para os dois, era de extrema importância.
Um dia, ele pegou um avião e voltou para a Alemanha. Mas, antes, ele se despediu de Maria. Ninguém chorou, na realidade, ambos sorriram. Eles se beijaram, pela última vez. Se abraçaram, pela última vez. E ele disse que iria voltar à São Paulo. Ela sorriu, mas não acreditou. Ela preferiu pensar que nada seria o mesmo outra vez e que era melhor ele levar essa parte da vida dela com ele. Maria e Vincent se olharam pela última vez.

Vincent voltou para a Alemanha para ser um grande artista. E Maria voltou para casa, para viver uma grande vida.

domingo, 25 de abril de 2010

Encontro

-Oi.
-...oi.

Confusão.

-É você.
-Não, desculpa, sou outra.

Suspiros.

-Ah, mas tem certeza?
-Não, não tenho certeza...mas devo ser outra.

Roer unhas.

-Bom, você é linda.
-Sou? Sou, não?
-É, é sim.

Coração acelerado.

-Sabe, eu não queria ser outra.
-Então, não seja.

Pausa

-Você viu esse pôr-do-sol?
-Lindo.

Olhares.

-Acho que sou eu mesmo, viu?
-É, eu sei que é você.

Sorrisos.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Os três mosqueteiros

Eu tenho certeza que não fui a primeira. E não serei a última. Mas eu tenho outros dois mosqueteiros.
É mais do que o simples fato de sermos três pessoas que andam juntas. Até porque, se fosse assim, nós poderiamos ser os três porquinhos. No entanto, não é o caso.

Então, somos os três mosqueteiros. Porque eu não consigo mais imaginar a vida sem esses dois. E não é só a nossa amizade que é especial, eles são pessoas especiais. E eu... Bom, eu sou aquela pessoa sortuda, a que é amiga deles.

Se alguma vez já lhe ocorreu que é difícil encontrar O amigo. É isso mesmo. Pensar em todas as pessoas que vivem ao seu redor e perceber quem são os que, de fato, você sentiria falta, é muito complicado. Mas não percamos o foco...

Sobre esses indivíduos especias. Eu os conheci na pior das situações. Numa fase que a vida nem ia nem vinha. E com eles, isso não mais me parecia importar. Sabíamos que a convivência diária seria breve, mas eu jamais imaginaria a falta que isso me faria. E hoje, a saudade é muito grande.

À essas duas pessoas que me ensinaram humildade e dedicação, eu devo o mundo.
À esses dois que me fizeram rir em qualquer situação, eu devo a vida.
À esses dois que tiveram a persistência de quebrar o muro no qual eu me envolvo, não sobraram palavras.


(Obrigada, E e D)

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Aquela pessoa

Não foi fácil andar até aquele prédio. Muito menos entrar. Ela teve a impressão de ter voado até lá. Como se seus pés fossem inocentes na ação e não a tivessem levado até o prédio. Tudo que lembrava eram a sensação angustiante, o coração disparado e o medo. O medo de dar as caras. De mostrar que ainda existia. No entanto, a curiosidade tomou conta dela e a menina entrou na sala. Com um sorriso amarelo, avistou a amiga com quem trocou abraços, os quais a acalmou, e palavras de gratidão e saudades. Sentou-se bem na frente da lousa, em um canto perto da parede, como se esta pudesse protegê-la. Não podia. A pessoa entrou na sala, como sempre entrou, fazendo a garota relembrar dos antigos encontros. Ao fundo, ouviu sobre números e fatoração, mas, em primeiro plano, na sua cabeça, ouvia indagações próprias sobre a falta de olhares, a indiferença e o porquê de tudo isso. Aquilo a entristecia, a indiferença a atormentava, até que ocorreu: “Está fazendo direito?” Ela acenou que sim com a cabeça. “Na USP?” Ela mordeu os lábios e fez que não com a cabeça. “Mackenzie, então, muito bom” Mesmo? Ela respirou aliviada. Mas só sorriu quando ocorreu um “Tudo bem?”. “Tudo bem”. Ela respondeu.

Era isso que precisava. Precisava saber que ainda havia respeito, pelo menos. Não podia conceber a indiferença de alguém que, um dia, foi essencial. Ela se afundou na carteira e aceitou que sua vida era outra agora, e que era boa. Aceitou que o que tinha imaginado, há tempos, do que poderia acontecer, hoje, talvez, não fosse mais possível.

E restou uma tristeza. Uma tristeza gostosa que reafirmou tudo aquilo de bom que já havia acontecido. E sobrou também uma saudade. Saudade daquela pessoa que dedicou tanto tempo, tanto respeito e tanto carinho à menina.

Ela deixou de ser menina tempo depois de conhecê-lo. Mas gosta de se deixar ser quando o reencontra.

sábado, 27 de março de 2010

Consciência

Eu ia aproveitar a uma hora de luzes apagadas para escrever algo sobre o meio-ambiente. Mas não foi isso que fiz. Acabei me apegando à consciência.
Explico-me.
O fato é que tenho lido muito sobre como apagar as luzes hoje a noite seria bom para o meio-ambiente e tal... Mas, infelizmente, eu penso que a maioria das pessoas que estão no escuro agora não se lembrou de diminuir a hora do banho ou desligar a TV na hora de dormir. No entanto, passar esses 60 minutos no escuro será o suficiente para suas consciências.
Longe de querer discutir o que as pessoas deviam fazer para o meio ambiente (deixemos para outro dia), queria saber do se faz a nossa consciência.
Será que basta fingir?
Deveria arrumar o quarto, porém, apenas joguei todas as roupas no armário e fechei a porta.
Deveria ter feito o trabalho, mas acabei copiando o de um colega às vésperas da entrega.
Deveria começar a dieta, no entanto, segunda que vem, eu começo.
Será que bastou?
Eu acho que não.
Imagino a consciência como um grande baú.
Lá no fundo está tudo que acreditamos não usarmos, mas estão lá.
No meio, estão as coisas que não estão na ponta da língua, mas se você der uma mexidinha, elas virão à tona.
E, em primeiro lugar, está aquilo que nos tranquiliza ou perturba.
O armário de porta fechada está no primeiro plano do baú, junto com a dieta que começa na segunda e o trabalho já entregue.
No meio você vai encontrar a cara do professor quando percebeu que você não é o autor do trabalho, encontrará o cartão da academia que ainda não foi usado e a porta do armário aberta.
No fundo estarão os doces devorados, a insônia do dia anterior à entrega do trabalho não realizado e todas as roupas espalhadas atrás das portas fechadas do armário.
Se não houver turbulência, não há motivos para se preocupar. Mas a vida não é assim. E um dia ela te chacoalha de um jeito que não haverá como negar.
Espero que a vida chacoalhe a Terra e que venham à tona todos os banhos demorados, os computadores ligados por horas, as luzes acesas sem motivos, aquela ida à padaria de carro que poderia ter sido feita a pé e, claro, os 60 minutos de hoje, quando as luzes não foram apagadas.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Os vivos-mortos

Tem aquela noite que você sonha com aquela pessoa. Aquela lá que você achou que tinha esquecido. Aquela que você pensava sentir-se indiferente. Essa mesmo.
Você sonhou com ela. E, convenhamos, não precisamos de Freud para nos dizer: "Essa pessoa ainda vive em você".
É a reunião dos vivos-mortos (não mortos-vivos, já que essas pessoas vivem no mundo, mas apenas pareciam ter morrido para você, entende?).
Durante a reunião não há problema algum. É raro, enquanto o sonho acontece, perceber o quão estranho ele é.
Então você acorda.
E acorda com aquela sensação estranha. (Essa mesmo!)
Pensando: "Ã? Que estranho...."
No entanto, o estranho apenas começou, porque a partir daquela manhã você ressuscitará o morto que viverá em sua cabeça por sabe lá quanto tempo.
E o vivo-morto traz com ele toda uma bagagem de emoções, fatos, sentimentos que você achou que tinha enterrado com ele.
Ás vezes, esse ser deixa de ser morto para ser vivo novamente para você. Afinal, você sentiu falta dele.
Outras vezes, esse morto apenas o perturba. E, definitivamente, você não o quer vivo em sua vida.
Independentemente, o vivo-morto tráz um pouco de nós mesmos.
E esse pouco faz diferença.
Se formos sábios, acolheremos esse pouco e o usaremos para o bem. Se formos impacientes, ele será reprimido e você pensará estar bem.

Mas, lembre-se, o que não enterramos direito, sempre reaparece.

domingo, 28 de fevereiro de 2010

A verdade

"Na verdade sabemos dizer mentiras que parecem verdades, mas também sabemos, se o quisermos, revelar a verdade"
Hesíodo

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

O que nos define

-Oi, meu nome é Cláudia. Eu trabalho no circo.

Pobre Cláudia. Depois disso, há pouco que ela possa fazer para melhorar sua imagem.

Cláudia é estudiosa. Conhece muito sobre cinema e é uma excelente cozinheira. É mãe carinhosa e dedica parte do seu tempo ao trabalho voluntário. E, claro, Cláudia trabalha no circo.

Cláudia, Irene, Jõao, Ana... são pessoas.

Quem os define?
Eu, você, ele.
E quem está certo?

Será que um advogado tem mais mérito que Cláudia?
Ou ainda, será que a faculdade que Carlos cursou o faz melhor que Maria, que cursou uma outra escola?

O que é que nos define?
É o que fazemos? O que dizemos?

Não diga: o que somos.
Afinal, o que somos?

Uma leitura inicial de cada um pode acarretar no preenchemento das lacunas restantes. Preenchimento, esse, incorreto. Como completar o perfil de alguém baseado em 2 informações?

Cláudia tem o grande mérito de conquistar as pessoas. Mas, e quando você é analisado pelo papel e não pessoalmente? Como conquistar como um perfil como o dela?

Termino com mais perguntas que respostas.

Porém, com um convite: não preencher as lacunas antes de conhecê-las.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Nossas vidas

E o que faz as nossas vidas serem certas ou erradas?
E se os caminhos escolhidos não levam a lugar algum?
E se tudo o que basta são alguns segundos de alegria de tempos em tempos?
E aquela pessoa que parecia tudo para você e ,agora, nada mais é?
E o perfume da casa da sua avó que parecia solucionar qualquer entrave?
E a música que fazia você chorar?
E os sonhos que você tinha e não tem mais?
E aquele vestido guardado, ainda planeja usar?
E ,um dia, a sua cor favorita foi rosa?
E lembra quando o mundo não parecia girar?

E todo o resto?

E o que mais perguntar?

domingo, 14 de fevereiro de 2010

A certeza

A gente passa o dia se perguntando. Duvidando.
O que eu aprendi esse ano é incrivelmente valioso. Pelo menos para mim.
Duvide menos, faça mais.

Tenha medo, mas tenha coragem de enfrentá-lo.
Tenha força, e use-a com cautela.
Tenha sonhos, e a certeza de que tentou.

São essa três palavras, medo, força e sonho que me impulsionaram para tentar, mais uma vez, e outra, se fosse preciso.
Cercada dessas certezas, coisas maravilhosas aconteceram.

Primeiro, pessoas fantásticas cruzam seu caminho, e compartilham com você tudo aquilo que você imaginava passar sozinho.
Segundo, você aprende que o mundo não foi feito em 7 dias, mas em milhares. Aprende a dar um passo de cada vez.
E terceiro, percebe que você é capaz de tudo aquilo o que queria, mas talvez a vida o levasse para outros cantos, inimagináveis, mas ainda excelentes.

E ficou a certeza. Aquele sentimento de que hoje o dia pode ser delicioso, e que na noite de ontem, se choveu, foi bom, você cresceu.
Entre palavras
E afagos
Completamente
Perdi-me

Ensaiava de saia
Vestida à dança
Um ritmo novo
Desconhecido

Pedi sua mão
À afável melodia
Aceitou o convite
E, então, se fez
Mais do que um amigo

Um pouco de realidade em excesso

Já me desculpo pela antítese no título. (sim, talvez nomeie todas as figuras de linguagem: eu me dou esse aval)O fato é que acabei de assistir "O casamento de Rachel". Trágico, complexo e bonito são apenas alguns dos adjetivos que consigo pensar no momento. E ,claro, muito real.Como uma amiga minha diz "Para ver realidade, eu fico em casa". Concordo muitas vezes. Mas não nesse caso.
Dessa vez, meus R$9,00 me proporcionaram mais que realidade, me proporcionaram um conforto de que estamos todos no mesmo barco, ou nesse caso, numa mesma casa, tentando conviver com nossos amigos, familiares, e o pior de tudo, com nós mesmos.A minha feliz supresa foi perceber que os diálogos do filme em muito se assemelham aos da minha família (minha segunda feliz supresa foi a fantástica performance da ex-princesa, Anne Hathaway). A sensação de que as palavras não eram ensaiadas, a falta de frases de efeito (porque, aceitemos que na vida real são pouquíssimas as frases de efeito cinematográfico), mas nem por isso menos emocionantes, deram uma nova dimenção ao filme.
Acredito que a intimidade entre parentes próximos é, ao mesmo tempo, o que salva e o que destrói. Salva porque eles são nossa fortaleza e destrói porque eles são um dos poucos com quem somos autênticos, para o bem e para o mal.
Talvez, porém pouco provável, só a minha casa seja disfuncional e eu esteja jogando palavras na tela. Só posso dizer por mim mesma, mas penso que o que nos aproxima, nos afasta. (novamente, uma antítese)Fecho essa viagem recomendando o filme àqueles que vivem no planeta terra e possuem mínima sensibilidade.

Nada supera

E me pergunto o que nesse mundo pode me fazer sentir tão leve, completa e feliz como quando se recebe aquele esperado "sim", seja por atos, ouvido, ou até escrito, daquele que por tantas noites sumiu com seu sono, e se dormia, invadia seus sonhos, e que roubou sua atenção por infinitas horas de todos os dias e foi assíduo a casa fantasia.
Me pergunto e nada respondo. Isso me faz sorrir.

Quando eramos menores

Talvez, mas apenas, talvez, a vida fosse mais fácil quando eramos pequenos. Longe de ser saudosista, reflito.
Minha sobrinha, com seus sete anos, está experenciando sua primeira paixãozite. Durante suas férias, a baixinha me contou tudo sobre o tal Tiago Lopez. (Adoro como ela sempre usa o nome inteiro dele! É tão glamuroso!) Mas o fato é que ela sempre narrava com muito entusiasmo suas perseguições atrás menino durante o intervalo.
Pausa.
Eu sou a única que acha esse detalhe fantástico? Afinal, ela está, literalmente, correndo atrás do menino. (Aliás, segundo a pequena, suas amigas também correm atrás dele.) E melhor, ela está feliz!
Quando foi que colocaram nas nossas cabecinhas a serem moldadas que as meninas têm que esperar pelos meninos sentadinhas para não sujar o vestido?
Bom, a história segue com o evento de hoje. Fui buscá-la na escola e perguntei como estava o tal Tiago Lopez. Ela respondeu que ele estava "lindo".
Então, eu perguntei, casualmente, se ela havia corrido atrás dele no intervalo. Ela respondeu que "não".
Fiquei ligeiramente espantada, até que ela completou "Corri atrás dele na educação física mesmo".
Brilhante!

Pois é, talvez, mas só talvez, devêssemos correr mais.

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Voltei. E não sei o porquê.