domingo, 25 de julho de 2010

As Palavras

Eram as palavras que ela queria ouvir. E quando elas vieram, ela fez sentido de cada uma em sua cabeça, e seu significado aumentou. Saboreou cada uma delas e se prendeu à principal.

Ela queria dizer tanto. Procurou muitas palavras, mas nenhuma parecia transmitir o que queria dizer sem ter que dizer as palavras em si. Engoliu muitas frases e por alguns minutos pensou que não ia conseguir dizer nada. E, no entanto, queria dizer muito.

Talvez o silêncio ou, ainda, o olhar dela fez com que ele perguntasse se havia algo de errado com o que tinha dito. Claro que não. Estava tudo tão certo que ela não encontrava as palavras tão certas quanto o momento. Logo ela, que tinha tanta intimidade com palavras.

Então, ela afirmou aquilo que se passava em sua cabeça. Disse que era ótimo. Que assim, ela não seria a única. E sorriu. Sorriu por conseguir dizer alguma coisa. Mas algo ainda faltava. Contornou o rosto dele com os olhos. Foi quando tomou plena consciência do que sentia.
Mesmo sabendo que as palavras não seriam suficientes, ela as retribuiu, e, quem sabe, elas transmitiriam o que sentia.

Quase sussurrando, ela sorriu e disse.

‘Eu também estou apaixonada por você’

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Malas prontas

O medo, então, passou.

Ela deixou parou de andar para trás.

Passou a correr para frente.

Esqueceu de prender os cabelos.

E se divertiu no caminho.

Deixou o mundo de lado.

Nem parou para olhar para trás.

Cicatrizou antigas feridas.

Deixou um bilhete para os pais.

Viveria sua vida.

Ela mordeu os lábios.

Sabia que estava perto.

Muito perto.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Sobre meninas e mulheres

Ela abriu a gaveta da penteadeira da mãe. Vasculhou os objetos, não sabia exatamente o que procurava. Encontrou uma fita de cetim cor-de-rosa e pegou. Na frente do espelho, examinou seu rosto, prendeu os cabelos com as mãos e imaginou como poderia prender a fita. Decidiu por prender os longos e ondulados cabelos castanhos num rabo de cavalo com uma chuquinha que estava presa em seu pulso. Com os fios no ar, passou a fita pelas mãos, sentindo a textura do cetim. Sorriu. Se olhou no espelho e delicadamente amarrou a fita cor de rosa em volta do rabo, para finalizar, fez um grande laço. Satisfeita, observou o laço se movimentar em harmonia com sua cabeça.



Voltou-se, novamente, para a gaveta. Nada mais a interessava. Fechou e partiu para a gaveta superior. Extasiou-se. A maquiagem da mãe deslumbrou a menina. Passou a mão por entre os cosméticos, sem pressa de decidir. Finalmente, escolheu um bastão preto e comprido. Pegou-o como se pudesse quebrar a qualquer momento. Fitou o objeto, tentando descobrir para que servia. Na primeira tentativa, destacou a tampa do resto do bastão para encontrar um pincel diferente dos que conhecia, mas, logo, o identificou e se lembrou dos movimentos da mãe em seus cílios. Imitando-a, a garota passou o pincel pelos cílios, de baixo para cima. Olhou-se no espelho. Algo ainda faltava.


De volta à gaveta, procurou aquele pó rosado que a mãe sempre passava nas bochechas. Encontrou-o e, sem delicadeza, espalhou-o pelas bochechas. Riu. O resultado foi diferente do esperado. A cor rosa destacada fortemente em seu rosto a deixaram com um ar de boneca. A jovem não se importou. Pelo contrário, gastou alguns minutos se admirando frente ao espelho. A luz do sol do fim da tarde perpassou pela janela, pelas brancas cortinas e iluminou o laço de cetim daquela menina pintada.


Sabendo o que queria, pegou da gaveta o batom vermelho preferido de sua mãe. Retirou a tampa e girou a parte de baixo do bastão, fazendo com que o batom surgisse da embalagem, como nos filmes. Ela secou os lábios com as mãos, fez um biquinho e começou a pintar sua boca de vermelho. Após a primeira passada, relaxou os lábios. Descontente, pressionou o lábio superior contra o lábio inferior. Houve uma melhora, mas a garota só se satisfez após a segunda camada de vermelho.


Contemplou sua imagem. O reflexo mostrou uma garotinha. Mas ela se sentiu uma mulher.


Até hoje, quando se sente incapaz de enfrentar a vida de frente, ela entra no quarto de sua mãe, senta-se à penteadeira e abre uma gaveta. E vasculha suas memórias, até encontrar aquela que a transforma. Abre mais que embalagens, abre seu coração, na esperança de que a mulher do reflexo seja a mesma sentada à penteadeira.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Príncipes e Princesas

Quando eu era pequena, ganhei uma Barbie. Logo depois, ganhei um Ken. Pela minha lógica e pelo o que eu conhecia do mundo, através de filmes da Disney e de músicas do Vinícius que tocavam na minha casa, a Barbie tinha que ficar com o Ken. Ótimo. Eles casaram, montaram uma casa de madeira, que eu pintei de canetinha de várias cores, mobiliaram a casa com móveis em miniatura e tiveram muitos filhos, que eram, bizarramente, do tamanho deles, porque eu não tinha uma barbie criança.


O Ken cortejou a Barbie, daquele jeito que as princesas eram cortejadas nos livros, e ela se apaixonou por ele, como nos filmes que assistia.

Eu ainda era pequena, mas não tão pequena, e as Barbies faziam parte da minha vida de outra forma: elas ficavam sentadas na estante e eu já não brincava com elas. No entanto, tudo o que elas haviam feito ficou em mim. Então, eu tinha uma cadeira rosa, que era o meu trono, e brincava de princesa. E, sempre, havia um príncipe.

Eu cresci mais um pouco. Foi quando as coisas ficaram confusas. Comecei a ouvir que as mulheres deveriam ser independentes e massacrar os homens. Eu não entendi o porquê, mas anotei o recado. Tomava críticas de quem dizia que eu vivia no mundo da lua, sempre fantasiando sobre príncipes e princesas.

Aconteceu que eu virei uma adolescente e meninos deixaram de viver no meu mundo da lua, para viver, simplesmente, no meu mundo. A verdade? Bom, eu não pensei em nada disso por um bom tempo. O legal era estar com eles.

E um dia, eu cresci. E passei a questionar o porquê que eu deveria massacrar os homens, se eu gostava deles. Porque a minha mãe começou a me dizer que não existiam príncipes, apenas sapos? Porque começaram a relatar estatísticas do índice de divórcios? Porque passaram a contar vantagem das mulheres bem sucedidas e solteiras?

A verdade não parecia surgir para mim. Apenas me confundiam todas essas informações. Mas acreditei piamente que não existiam príncipes e princesas.

Mas por muitos dias seguintes, contemplei o olhar que a minha mãe repousou no meu pai, reparei nos namorados de mãos dadas do metrô, ouvi minha amiga falando sobre o aperto no coração que a música Lugares Proibidos causava nela. E, então, eu mesma me peguei sorrindo, aquele sorriso bobo, que só aparecia quando pensava em certas tardes.

Pois é, eu acredito, sim, em príncipes e princesas.